11 de novembro de 2011

Carne, Osso: animais humanos em frigoríficos


Para os membros de nossa sociedade preocupados com as condições de vida dos animais não humanos, fica a necessidade de enxergar esta situação calamitosa em um contexto mais amplo de vida urbana e industrializada, onde, independentemente da espécie – e do reino – tudo vira matéria-prima, peça em sistemas produtivos cujo valor se pauta pela produtividade. Isto, certamente, revela os limites do veganismo como apenas uma variação do consumo, escancarando a necessidade de transformações estruturais em nosso modo de vida, nossa relação com o resto da natureza. Inclusive, é necessário encarar com coragem, o modo de produção de nossos vegetais.


O documentário brasileiro Carne, Osso, recém lançado, revela outra triste realidade associada  à indústria da pecuária e de frigoríficos, para além das condições de vida e morte de animais não humanos: a torturante condição de trabalho de seus empregados.           O filme revela o cotidiano destes trabalhadores, 750.000 em nosso país, expostos a rotinas de trabalhos deveras perigosas e repetitivas. Para desossar uma coxa de frango, por exemplo, pode-se realizar algo próximo de uma centena de movimentos manuais por minuto durante várias horas por dia. Nem conversar com os colegas de trabalho ou ir ao banheiro é permitido. Em outro setor, trabalhadores abrem os corpos dos animais - anteriormente torturados - com serras elétricas e facas, um ao lado do outro. Escorregar no chão ensanguentado ou, por um descuido, deixar o pesado cadáver trombar com um corpo de operário levando-o a perder dedo, braço, perna, é algo corrente na história destas empresas. Extremamente comum é a existência de operários com tendinites, dores, artroses, atrofias de nervos, problemas de juntas e de coluna, entre outras enfermidades, inclusive psíquicas (o índice de depressão é três vezes maior que a média dos trabalhadores), advindas dos movimentos extremamente repetitivos e das altas cobranças de produtividade.
As indústrias sempre negam sua culpa pela péssima condição de saúde gerada por suas linhas de produção, tratando os trabalhadores com antiinflamatórios e outros remédios para dor, sem interromper ou diminuir a intensidade de suas jornadas de trabalho, fazendo com que os quadros se agravem e, ainda jovens, muitos destes venham a ser incapacitados para as suas ou quaisquer outras funções que exijam algo de seus corpos.
Em época de tanta discussão sobre os gargalos de nossa Previdência Social, vale trazer o dado apontado pelo filme de que mesmo com a contribuição de 3% do salário dos trabalhadores (por serem as indústrias frigoríficas consideradas de alta periculosidade), ainda assim o Estado arca com mais R$ 7 bilhões direcionados aos trabalhadores adoentados e inutilizados por seus trabalhos nestas linhas de produção, dado o enorme número de pessoas nessas condições.
Nosso país se orgulha de possuir o maior rebanho bovino do mundo, ser o maior exportador de proteína animal e possuir a maior das indústrias frigoríficas. Um setor econômico alardeado como fundamental para o tal desenvolvimento da pátria. Seria de grande valor, antes de festejos impensados, checar o que estes dados significam para a vida de todos os envolvidos nestes processos produtivos, humanos e não-humanos. Festeja-se a industrialização da vida, a institucionalização da tortura, a transformação de processos vitais em linhas de produção cada vez mais aceleradas, fornecendo carnes e seus subprodutos industrializados em cada vez maior quantidade, maior variedade, maior facilidade para o consumo cada vez mais rápido pela acelerada população.


Por Willian Santos

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